TORPEDO # 49 - É hora de agradecer muito a Francis Ford Coppola
“Megalópolis”, filme exuberante que levou 40 anos para ficar pronto, é obrigatório para qualquer pessoa que tenha o cinema como algo importante em sua vida
CINEMA
Conflitos da Roma antiga numa Nova York futurista
Apreciar arte é algo incrível. É gostoso, é inspirador, às vezes pode mudar sua vida, ou pelo menos sua visão sobre algumas coisas. No cinema, então, o impacto pode ser muito forte. É a arte que mistura várias outras, gera uma conexão direta com quem vê. O diretor americano Francis Ford Coppola já colaborou com a vida de muita gente ao oferecer nos cinemas obras que deixam uma marca eterna. Se qualquer lista dos dez melhores filmes de todos os tempos não incluir “O Poderoso Chefão” (1972) e “Apocalypse Now” (1979), merece ser desprezada. Não é uma questão de gosto pessoal, é só constatar como em tudo o que importa em um filme essas obras alcançam uma perfeição irretocável. Dos anos 1980 para cá, Coppola teve confrontos brutais com a lógica do mercado. Fez dezenas de milhões de dólares, perdeu dezenas de milhões de dólares. A miopia intelectual dos donos da grana em Hollywood interrompeu a carreira do diretor, até porque Coppola nunca esteve disposto a fazer filmes pequenos. Nem deveria, porque é o maioral quando a ideia é construir verdadeiros universos particulares na tela. Depois de toda essa atribulação, chega “Megalópolis”, projeto que ele tentou produzir durante 40 anos. Num filme que já teve entre os atores cogitados até Paul Newman, o diretor escala para o papel principal um dos mais talentosos dessa geração, Adam Driver. Apenas a reunião desses dois nomes, diretor e ator, é suficiente para tornar o filme obrigatório. Mas precisamos falar sobre “Megalopólis”. Eis aqui um resumo muito condensado: em Nova Roma, uma versão de Nova Iorque misturada com as cidades do Império Romano e um toque futurista, é travada a luta entre um artista visionário, Cesar Catilina (Driver), e o prefeito “do mal”, Franklyn Cicero (Giancarlo Esposito, também em grande desempenho). Não vale a pena avançar mais no roteiro antes de assistir. As situações e os diálogos são tão delirantes quanto o visual arrebatador. Assistir ao trailer dispara uma vontade louca de ir ao cinema.
Então é hora de prestigiar um gênio que, aos 85 anos, consegue entregar algo tão poderoso. Mas, sempre tem um “mas”, é preciso dizer: por incrível que pareça, a exuberância visual na tela pode cansar, e algumas partes do roteiro não levam a lugar algum, é uma história desencaixada. Até com esses problemas, “Megalópolis” talvez tenha mais força cinematográfica que todo o resto da programação das salas em 2024. Aqui está o trailer.
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FOTOGRAFIA
As faces alegres de uma festa dos mortos
Felipe Machado é jornalista, autor de vários livros e apresentador do podcast “De Onde Vêm as Ideias”, que reúne conversas com gente muito interessante sobre criatividade e Inteligência Artificial. Mas, para aqueles que gostam de bater cabeça, ele também é famoso por ser guitarrista e fundador do Viper, uma das bandas mais importantes da cena pesada brasileira. No entanto, essa indicação aqui não tem nada a ver com IA ou heavy metal. Felipe está lançando agora pela Afluente Editora o livro “La Fiesta de los Vivos”, um registro fotográfico da parada do Dia Dos mortos na avenida Paseo de la Reforma, na Cidade do México, em 2018. Em um texto introdutório, o autor diverte ao explicar que essa parada especifica é muito mais recente do que a tradição centenária de comemorar o Dia dos Mortos naquele país Na verdade, a criação da parada tem a ver com a filmagem de uma aventura de James Bond na cidade, um episódio bem engraçado.
Felipe optou por um corte radical: deixou de lado fotos panorâmicas que talvez servissem para demonstrar a grandiosidade da parada, e partiu para fotos fechadas no rosto dos participantes. Os detalhes coloridos das caveiras sobre as faces formam uma galeria muito curiosa: por baixo das tintas que deveriam servir à formação de uma fisionomia assustadora, há evidente alegria no sorriso dos fotografados. O Dia dos Mortos é realmente uma festa. Numa boa jogada, haverá neste sábado, Dia de Finados, lançamento do livro no Rio de Janeiro, no Festival Maquinaria, na Casa70Rio, no Instituto Brando Barbosa, rua Lopes Quintas, 497, às 16h.
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STREAMING
Um filme de super-herói, sim, mas bem diferente
Quem está acostumado a acompanhar o Universo Cinematográfico Marvel sabe muito bem como seus roteiristas adoram uma dimensão paralela, um mundo alternativo e coisas assim como cenário de aventuras do Homem-Aranha, do Thor e outros bambas. Mas pouca gente deve saber que existe realmente uma dimensão paralela de super-heróis. E o nome é Jagad Sinema BumiLangit. Traduzindo do idioma da Indonésia, é Universo Cinematográfico BumiLangit, um punhado de filmes e séries que reúne os super-heróis de um conglomerado de HQ do país asiático. Pode parecer algo um tanto inalcançável para o público brasileiro, mas não é. “Gundala: A Ascensão de um Herói” está disponível no Prime Video e conta a origem de um dos nomes mais importantes entre os superpoderosos combatentes do crime na Indonésia. O filme é de 2019, mas Gundala já habita as páginas de gibis desde 1969. É necessário avisar: não é nada original. Gundala recicla vários elementos muito manjados de heróis da Marvel ou da DC. Ganhou seus poderes de forma mística. Tem superforça e emite rajadas elétricas. Seus inimigos são crápulas que formam esquadrões de assassinos recrutando crianças órfãs. Mas a ação flui bem, e tudo ganha atrativo especial, porque a história se passa num ambiente politicamente conturbado, com grandes manifestações nas ruas e confrontos entre militantes e soldados. E a parte da história que foca as crianças é interessante. Para quem busca um passatempo, vale arriscar com as aventuras de Gundala. Para quem é fã de HQ, a coisa muda de figura. É obrigatório ver e sentir como são as histórias de super-heróis em um ambiente tão diferente. Confira aqui o trailer.
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LIVRO
Uma professora perfeita para ensinar a escrever bem
Ursula K. Le Guin (1929-2018), embora não seja tão conhecida no Brasil, é um nome incontornável da ficção científica, ou, como a crítica prefere agora, ficção especulativa. Na verdade, entre 1959 a 2018 ela escreveu mais de 20 romances e cerca de uma centena de contos, além de poesia, ensaios, traduções e 13 livros infantis. Para ter ideia da importância de suas obras, notadamente os romances de sci-fi ambientados no “Universo de Hain” e os volumes de fantasia que formam o “Ciclo de Terramar”, basta dizer que ela é a escritora favorita de Neil Gaiman, este sim com enorme legião de fãs brasileiros. Procurar nas livrarias pela ficção de Ursula K. Le Guin é garantia de encontrar coisa boa, mas a indicação aqui é para um de seus últimos lançamentos em não ficção, que sai no Brasil pela editora Seiva. Trata-se de “Como Criar Histórias: Um Guia Prático para Escritores”. É uma obra essencialmente didática, dividida em dez lições. Além do texto espirituoso da autora, ela faz um trabalho incrível ao buscar exemplos sobre o que está comentando em textos de monstros da literatura, como Jane Austen J.R.R. Tolkien e Virginia Woolf. Ursula se dedica a questões que são universais no ato de escrever em vários países e culturas diferentes. Como, por exemplo, combater a longa extensão das frases ou o exagerado uso de adjetivos e advérbios. Acaba sendo um curso completo e muito eficiente.
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O MUNDO JÁ FOI MELHOR # 49
Fotos comprovam: a Terra foi habitada por gente muito bacana
Olhar para a foto acima, de 1978, é meio como presenciar Michelangelo pintando o texto da Capela Sistina. o momento raro de ver artistas produzindo obras-primas. Francis Ford Coppola discute com Marlon Brando a próxima cena que iriam rodar de “Apocalypse Now”, um dos grandes filmes da história da humanidade. Nele, Brando interpreta o Coronel Kurtz, um comandante enlouquecido na Guerra do Vietnã que cria sua própria milícia para disseminar violência na região. O filme teve muitos problemas durante sua produção, incluindo um tufão que destruiu cenários e um infarto do ator principal, Martin Sheen, que faz o papel do oficial americano que tenta encontrar Kurtz. Segundo testemunhas, às vezes Coppola e Brando conversavam durante duas ou três horas antes de rodar uma tomada que nem chegava a três minutos. Seria maravilhoso poder ouvir o que esses dois conversavam.
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