TORPEDO # 54 - “Ruptura” volta para conquistar corações e mentes
A série que borra os limites entre trabalho e vida pessoal de uma maneira até então inimaginável começa a soltar a segunda temporada. E continua fascinante
STREAMING
“Ruptura” traz riso e reflexão na relação com o trabalho
Pessoas que gostam do mundo das séries, que dedicam boa parte de seu tempo a sentar no sofá e acompanhar o que tem de melhor nesse verdadeiro passatempo contemporâneo, essas pessoas precisam ver “Ruptura”, a série que tem sua segunda temporada lançada agora em episódios semanais na AppleTV+. Não é uma questão de gostar. É algo que deve ser encarado como uma obrigação. Pelo que mostrou na temporada de estreia, nos idos de 2022, e o que já foi possível ver até aqui de sua sequência, esta é uma série que ocupa a mais alta prateleira do streaming. Tem uma dimensão semelhante a “Seinfeld”, “Friends”, “Lost”, “24 Horas”... Como essas, não se trata apenas de contar uma boa história. É um projeto que leva a concepção de séries uma passo à frente. Ou vários. A razão é a espantosa capacidade de captar o que está no movimento do mundo nesta época. O tal Zeitgeist. Num momento em que a relação das pessoas com os seus empregos não está mais resumida a remuneração e carga horária, com a geração Z associando trabalho a uma filosofia de vida, “Ruptura” cria uma empresa, a Lumon, na qual os funcionários usam um chip que deixa em mundos separados a personalidade profissional, “innie”, e a personalidade fora do trabalho, “outie”. Uma vez com a chave virada para “innie”, eles estão mais aptos a desempenhar atividades repetitivas em tarefas às vezes nem um pouco lógicas, sem justificativas. O enredo se concentra em alguns funcionários: Mark S. (Adam Scott), Irving B. (John Turturro), Helly R. (Britt Lower), Dylan G. (Zach Cherry) e Milchick (Tramell Tillman), na nova temporada provido a chefinho. Lidando com desejos de fugir dessa situação e expor irregularidades da Lumon, eles agora precisam conviver com uma nova colega de trabalho, Huag (Sarah Bock), praticamente uma criança que parece ter ido possuída pelo espírito de um coach maligno (perdão pelo pleonasmo). Parte da crítica, uma parte pequena, questiona se “Ruptura” não seria uma série cerebral demais. Bem, em seu início, nos anos 1990, “Seinfeld” também era rotulada de série “cabeçuda”, e deu no que deu. Se o objetivo aqui é recomendar o melhor que há no entretenimento, “Ruptura” é incontornável, com muitos episódios dirigidos pelo ator Ben Stiller. Repetindo, é preciso assistir, mas não sem antes ver a temporada inicial, pois isso seria um passo totalmente equivocado. É aconselhável se acostumar um pouco com as agruras de Mark S. e seus amigos para compreender seu mundo particular. Confira aqui o trailer.
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MÚSICA
Lambrini Girls cobre vários gêneros com véu punk
O último dia 10 de janeiro foi importantíssimo para o séquito enorme de adoradores da banda britânica Lambrini Girls. Saiu o primeiro álbum, “Who Let the Dogs Out”, que consolida o som pesado e acelerado que desde 2019 conseguiu arregimentar muito fãs. Na verdade, naquele ano a guitarrista Phoebe Lunny formou o grupo em Brighton, com mais três amigas. Essa formação lançou apenas um single, “Homewrecker”, em 2020. Em 2022, quando o EP “You’re Welcome” chegou às plataformas, Lambrini Girls já estava definida como uma dupla, com Phoebe e a baixista e vocalista Lilly Maciera. Por dois anos, elas lançaram seis singles que asfaltaram o caminho na cena roqueira da ilha, e logo elas conseguiram participar de todos os grandes festivais britânicos. Para definir o som delas em quatro letras, pode ser “punk”. Mas indo muito além do antigo punk que só se preocupava em recriar rock rápido com o menor número possível de acordes. As meninas podem fazer rock, baladas, sons eletrônicos, dance rock, rap, enfim, muitas coisas diferentes, mas o filtro punk é aplicado em tudo o que elas gravam. E tem muta coisa legal. Bons exemplos são “Boys in the Band”, “White Van” e duas que estão no álbum de estreia, “Big Dick Energy” e “Love” (clique nos títulos para ver os clipes). Para sentir a fúria das moças ao vivo, é bom conferir uma sessão que elas fizeram no estúdio da KEXP, rádio esperta de Seattle. Eis aqui o link.
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CINEMA
Conspiração movida a ganância num cenário de fé
“Conclave” foi até bem contemplado na relação de indicações ao Oscar 2025 anunciada nesta quinta-feira. São oito indicações, entre elas a presença na exagerada lista de dez filmes que disputam o Oscar principal e Ralph Fiennes entre os indicados a Melhor Ator. No entanto, uma análise mais detalhada em cada categoria não apresenta nenhum indício de que o filme terá uma noite feliz na cerimônia de entrega do prêmio. Dificilmente vai ganhar alguma coisa. E não poderia ser diferente. “Conclave” não é não é exatamente o que se costuma chamar de “filme de Oscar". Tem um elenco de nomes famosos, mas é dirigido pelo não muito conhecido cineasta alemão Edward Berger e trata de um tema que não costuma levar multidões aos cinemas: os bastidores da Igreja Católica. Fiennes interpreta o cardeal Lawrence, escolhido pelo Vaticano para conduzir a escolha de um novo papa. Nesse cenário, ele vai acabar mergulhado numa trama de conspiração que pode abalar o mundo se for revelada. O diferencial principal em “Conclave” é que não é exatamente um filme de padres. A questão da fé está muito distante do centro da história, e as dificuldades e pressões pelas quais Lawrence passa são frutos da ganância humana por riqueza e poder, o que produz sequências quase detetivescas. De certa forma, seria possível ambientar o que acontece no filme dentro de uma grande empresa de qualquer outro perfil. Ter um elenco com Fiennes, Stanley Tucci e John Lithgow ajuda muito. São atires sólidos, irretocáveis, que fazem o espectador esquecer que está numa trama dentro do Vaticano. Mais uma vez, é bom entender que “Conclave” é um drama sobre ambição, esteja ela em homens que usam batinas ou não. Eis aqui o trailer.
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STREAMING
Um filme fundamental na nova era Trump
“A Cozinha”, numa olhada apressada, pode parecer como um longa que tenta ser um filhote temático da bem-sucedida série “O Urso”. Mas o filme dirigido pelo mexicano Alonso Ruizpalacios, do bom “Um Filme de Policiais” (2021), é muito mais subversivo, contundente e cheio de fúria contida, mas prestes a explodir. Disponível na Max e no Prime Video, tem como cenário o movimento alucinado de clientes na hora do almoço no The Grill, restaurante em Manhattan que já foi melhor, mas hoje é apenas um ponto recomendado nos guias turísticos, sem grandes atrativos. O enredo é disparado pelo sumiço de uma grande quantia de dinheiro do caixa do estabelecimento, o que provoca interrogatórios para todos os funcionários. Na tensão natural que isso provoca, histórias pessoais são escancaradas e os empregados se revelam pessoas oprimidas pela incerteza que assombra os imigrantes ilegais nos Estados Unidos. Assistir a esse filme poucos dias depois da nada tranquila ascensão de Donald Trump de volta à presidência ganha uma dimensão assustadora. Além de um roteiro primoroso, o filme faz um uso incrível da fotografia em preto e branco. E há uma longa cena, de mais de 15 minutos, gravada em uma única tomada, bem aberta, para passar a realidade caótica do restaurante em plena ebulição. E o elenco é ótimo, principalmente Raúl Briones, que interpreta Pedro, imigrante ilegal que trabalha há anos no restaurante e começa uma relação com a garçonete Julia, que está grávida, papel de uma ótima Rooney Mara. Impossível ver o filme e depois ter tranquilidade ao olhar para Donald Trump no noticiário da TV. Veja aqui o trailer.
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O MUNDO JÁ FOI MELHOR # 54
Fotos comprovam: a Terra foi habitada por gente muito bacana
Na semana passada, a morte do diretor David Lynch provocou a divulgação de vários depoimentos de atores que trabalharam com ele, e a impressão geral aponta o cineasta como uma pessoa incrível no set, capaz de explorar a criatividade de seu elenco e de sua equipe ao construir um ambiente divertido e acolhedor. Recordando diretores que carregaram uma atmosfera parecida para cada set de filmagem, é inevitável pensar em Federico Fellini (1920-1973). O mestre italiano ficou famoso pelo ambiente divertido e às vezes anárquico que ele conseguia montar em suas produções. Eis aqui uma foto do diretor italiano em 1962, ao lado de dois amigos e ícones do imaginário coletivo dos fãs de cinema, Marcello Mastroianni (1925-1996) e Sophia Loren. O registro foi feito no set de “Oito e Meio”, em 1962, e é bom saber que Sophia não estava no elenco, apenas fazia uma visita aos amigos. Uma parte do mais criativo e mais belo cinema produzido na Itália está representada nesta foto.
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