TORPEDO Finde # 05 - A arte sem respostas fáceis de David Lynch

O cineasta americano, morto aos 78 anos nesta quinta (16), dirigiu mais de uma centena de obras, entre longas e muitos curtas, mas apenas sete estão no streaming

David Lynch morreu nesta quinta (16), aos 78 anos. Nem que vivesse 200 anos iria ver o mundo do cinema entender tudo de espetacular e subversivo que ele criou para as telas. Neste momento, centenas de sites estão exibindo biografias do cineasta e análises dos seus filmes, provavelmente usando em demasia o adjetivo “surreal”. Isso é plenamente justificável. Desde o espanhol Luis Buñuel, no começo do século passado, nenhum outro cineasta conseguiu transmitir em sua obra a essência do surrealismo, que é mostrar como funcionaria o pensamento humano sem as amarras da razão. Não é por acaso que Lynch fez obras em que várias linhas narrativas correm no roteiro, mas, como só ele ousaria, sem a menor intenção de cruzá-las num final palatável para o chamado “grande público”. Cumprindo sua vocação de curadoria, TORPEDO pode colaborar para marcar a passagem de Lynch indicando os sete filmes do diretor disponíveis hoje no streaming. Inacreditável! Apenas sete!

OBS: São filmes antigos, então alguns trailers têm uma qualidade não muito boa e até sem legendas. Mas servem como aperitivo do mundo particular de David Lynch.

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“O HOMEM ELEFANTE” (1980)

Amazon, AppleTV

Depois de inventar como protagonista um executivo estressado que tem um filho mutante, em seu longa de estreia, “Eraserhead” (1977), Lynch fez “O Homem Elefante” a partir de um personagem real. Na era vitoriana, John Merrick é um homem com o rosto e o crânio totalmente deformados, explorado como atração de um circo. Um cirurgião o resgata e, aos poucos, todos, inclusive o expectador, vão perceber que ele é uma pessoa muito inteligente. Mas, claro, a inserção no mundo chamado “normal” não é nem um pouco fácil e a nova vida de Merrick ganha tons dramáticos. O filme foi um sucesso de bilheteria e teve oito indicações ao Oscar, incluindo Melhor Filme e Melhor Diretor. Mesmo não vencendo nenhum, marcou a ascensão de Lynch ao primeiro time do cinema mundial. Clique para ver o trailer.

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“DUNA” (1984)

Looke, MGM+, Claro, AppleTV, Amazon

Em algumas entrevistas, Lynch declarou que, após o estrondoso sucesso da trilogia “Star Wars”, considerou que dirigir uma superprodução de ficção cientifica seria uma boa maneira de mostrar como ele estaria disposto a ceder para um cinema mais comercial. Mas, como tudo costuma ser mais difícil quando Lynch está envolvido, ele escolheu justamente “Duna”, à época tratado como um livro “infilmável”. O longa é incrível, mas o público não estava pronto para uma aventura de sci-fi tão “cabeça”, e os resultados financeiros não foram bons. Tinha no elenco Kyle MacLachlan, que se tornaria o alter ego do diretor em seus elencos, e o roqueiro Sting, no auge da popularidade no Police. Hoje, a diferença entre esta versão e a bem-sucedida de Denis Villeneuve é brutal. Ambas têm méritos e problemas. Clique para ver o trailer.

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“VELUDO AZUL” (1986)

Looke, AppleTV

Por alguns anos, foi considerada a obra-prima de Lynch. Depois, “Uma História Real” (1999) e “Cidade dos Sonhos” (2001) passaram a disputar essa distinção. É a visão do diretor para o filme “noir”. Ele mergulha nesse mundo de homens cínicos e mulheres fatais junto com o personagem Jeffrey Beaumont (novamente MacLachlan), que se envolve na trama que começa com a descoberta de uma orelha humana. Os acontecimentos vão levá-lo a tentar ajudar uma cantora (Isabella Rossellini, pura diva), que teve o filho sequestrado por uns gângsters da pesada, liderados por um alucinado personagem entregue a Dennis Hopper. Um delírio visual e sonoro, que deu a Lynch sua segunda indicação ao Oscar de melhor diretor. E ele não ganhou. Clique para ver o trailer.

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“CORAÇÃO SELVAGEM” (1990)

Claro, Amazon, AppleTV

É uma das melhores bilheterias no currículo de Lynch, estrelada por Nicolas Cage e Laura Dern, uma atriz que já tinha despontado como uma revelação em “Veludo Azul”. Foi o grande vencedor da Palma de Outro no Festival de Cannes, o ápice de Lynch em premiações. Mas, apesar de cair no gosto popular, é um dos filmes mais convencionais do cineasta. “Road movie” de perseguição, é um filme que certamente influenciou Quentin Tarantino e tantos outros. Cage e Dern são Sailor e Lula, vivendo um amor proibido e precisando fugir de pistoleiros que a mãe dela contratou para matar o rapaz. Vale saber que na época Lynch foi o responsável por uma guinada na carreira de Cage nos anos seguintes. Foi o diretor que convenceu o ator de que ele deveria focar suas escolhas em filmes de ação. Difícil saber se o conselho foi bom ou não. Clique para ver o trailer.

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“TWIN PEAKS: OS ÚLTIMOS DIAS DE LAURA PALMER” (1992)

Globoplay, Telecine

A série sobre o assassinato misterioso de uma garota numa cidadezinha introduziu o bizarro no horário nobre da TV americana, na virada para os anos 1990. Nada era parecido com o que o público estava acostumado a ver nas tramas policiais. O “mocinho”, agente Cooper (Kyle MacLachlan, lógico!), parecia um burocrata que tinha acabado de deixar pela primeira vez o escritório. Cada novo personagem que surgia tinha sua dose de esquisitice, suficiente par entrar na lista do suspeitos pela morte de Laura Palmer. E todos, principalmente as personagens femininas, carregavam uma lascívia em ebulição. Depois de duas temporadas que mudaram a TV (a primeira bem melhor do que a segunda, é bom dizer), ambas infelizmente hoje fora do streaming, Lynch fez este filme que conta episódios anteriores ao assassinato. Uma diversão sofisticada, mas desaconselhável para quem não viu a série. Clique para ver o trailer.

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“ESTRADA PERDIDA” (1997)

Telecine

Pois bem. Neste daqui Lynch desprezou todos os receios de não ser entendido. Escreveu um roteiro que exige bastante da imaginação e da paciência do espectador, que ao final é premiado com um filme realmente perturbador. Bill Pullman interpreta o saxofonista Fred Madison, que é acusado pelo assassinato de sua mulher, em circunstâncias muito confusas. Acaba condenado à execução. No corredor da morte, e aí começa a ficar difícil seguir a história, ele se transforma um homem mais jovem, Pete Dayton, passando a levar uma outra vida. Algum tempo depois, outro Pete Dayton aparece. O verdadeiro? Vai saber, né? Os caminhos dos dois Petes se entrecruzam, em cenas definitivamente surreais, e ainda falta aparecer um chefe mafioso muito estranho chamado Dick Laurent. “Estrada Perdida” pode servir de teste. Quem quiser saber se realmente se encanta com o estilo de Lynch deve assistir a este aqui e dizer o que acha. Clique para ver o trailer.

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“CIDADE DOS SONHOS” (2001)

AppleTV

Para muita gente, inclusive para a TORPEDO, é o melhor filme do diretor. Aquele que ainda preserva altos índices de estranheza e, mesmo assim, pode atrair vários tipos de espectadores. Betty, interpretada por uma jovem e deslumbrante Naomi Watts, é uma aspirante a atriz que chega a Hollywood e começa a viver experiências em um roteiro de puro delírio. Em seu caminho surgem um jovem diretor, um misterioso cubo azul e uma mulher com amnésia, sobrevivente de um desastre de carro, papel de outra jovem atriz belíssima, Laura Harring, que não teve grande carreira. A convivência das duas mulheres dispara um verdadeiro labirinto de situações e lembranças, e assim Lynch consegue montar seu mais perfeito cenário para uma história em que nunca é possível saber o que é mentira e o que é verdade. Até chegar o desfecho impactante. Uma obra-prima do cinema. Clique para ver o trailer.

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