TORPEDO # 61 - Dakota Johnson, Sean Penn e mais nada
O filme “Papai” se passa dentro de um táxi em Nova York, cenário claustrofóbico para motorista e passageira falarem sobre seus relacionamentos fracassados
STREAMING
Quando pegar um táxi é mesmo uma experiência
A jovem diretora e roteirista Christy Hall decidiu dar um tempo nos projetos de cinema e foi escrever uma peça de teatro. Meses depois, tinha nas mãos uma história com dois personagens conversando dentro de um táxi. Gostou tanto que logo soube o que precisava fazer com aquilo: um filme. Assim nasceu “Papai”, disponível no Max e na AppleTV, que surpreende pela escalação dos intérpretes do casal nesse encontro casual: Sean Penn e Dakota Johnson. De maneiras diferentes, são dois atores que neste momento enfrentam desafios pesados em suas carreiras. Aos 64 anos, Penn continua sendo lembrado como o maior ator de sua geração. Tem uma bacia de filmes incríveis e desempenhos memoráveis, como “Sobre Meninos e Lobos”, “21 Gramas” e “Milk”. Mas o azedume de seu humor foi prejudicando cada vez mais o relacionamento com produtores e colegas. Penn não consegue se encaixar em grandes produções e dedica seu tempo a produzir seus próprios documentários curtos ou então aceitando papéis em pequenas produções independentes, como “Papai”. Já Dakota Johnson chega aos 35 anos sem perder o rótulo de “nepobaby”. Volta e meia ela ainda é apresentada como a filha de Don Johnson e Melanie Griffith, Ou, pior, como a afilhada de Antonio Banderas. Há dez anos, ela fez furor como a mocinha que cedia a jogos sadomasoquistas na adaptação cinematográfica da sofrível saga literária “50 Tons de Cinza”. Mas ela abusou do direito de errar na escolha de seus filmes. O fundo do poço chegou no ano passado, com “Madame Teia”, a pior adaptação de quadrinhos já feita para o cinema. Ela e outros integrantes do elenco admitiram que nunca entenderam direito o roteiro que tinham que defender no set de filmagem. Embora rodado em 2023, antes de “Madame Teia”, só agora “Papai” ganha distribuição maior para ser, talvez, uma volta por cima da atriz. E de Penn.
Vale muito assistir ao filme. A produção é barata. Apenas os dois atores em cena e poucas câmeras se revezando para mudar o ângulo de exibir Penn ao volante e Dakota no banco traseiro. Numa rara aparição de cabelos loiros, ela interpreta uma garota que nem chega a dizer seu nome. Desembarcando á noite no aeroporto JFK, ela pega o táxi de Clark, em direção ao centro de Manhattan. A interação entre eles começa com um quase constrangedor flerte do motorista com a passageira, que ela leva numa boa, e aí os dois passam a comparar suas vidas para ver quem está mais por baixo. A conversa é encaminhada para os relacionamentos anteriores de cada um, e a partir daí Christy Hall esbanja seu talento para escrever diálogos. Hollywood não costuma dar muito espaço para filmes com gente normal tendo uma conversa normal. Quando isso acontece, os atores precisam segurar a onda. Dakota é graciosa, mas certamente tem poucos recursos como atriz. Mas isso não faz diferença, porque Penn arrasta a parceira com segurança para uma tensão dramática pesada. “Papai” mostra ao espectador que a vida comum às vezes vale um filme. Veja aqui o trailer.
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LIVRO
O ponto de virada na carreira de Bob Dylan
Elijah Wald é músico e escritor, autor de pelo menos uma dúzia de livros, falando de blues, Beatles ou rap. Apesar dessa versatilidade, sua paixão é mesmo Bob Dylan. Ele escreveu o livro que foi umas das bases para o recente e muito bom filme “Um Completo Desconhecido”, com Timothée Chalamet personificando o cantor na tela. “Dylan Elétrico: Do Folk ao Rock”, saindo aqui pela Tordesilhas, é a mais detalhada versão do episódio que marcou a carreira de Dylan e também o próprio rock and roll. Wald trata de sua apresentação no festival de folk de Newport, em 1965, quando ele apresentou três músicas tocando guitarras acompanhado de uma banda de rock, revoltando parte da plateia. Nos quatro anos anteriores ao episódio, Dylan tinha se tornado o maior nome do folk, rejuvenescendo esse gênero tradicional para as novas gerações. Mas seus adeptos eram radicais quanto ao uso apenas de violões e gaitas para tocar sua música . A guitarra era vista como uma grande ameaça capaz de deturpar o folk para sempre. Bem, Dylan realmente mudou o folk para sempre. Nas turnês seguintes, as canções clássicas que ele tinha gravado em formato acústico ganharam um peso muito maior no palco, e essa eletrificação aumentou a fama e a influência do bardo. O interessante no livro de Wald é que ele, além de esmiuçar bastante tudo o que aconteceu, derruba várias lendas urbanas a respeito do festival. Houve um grande repúdio por uma parte do público, é verdade, mas não exatamente uma quase batalha campal que alguns relatos imprimem ao episódio. “Dylan Elétrico” é um livro delicioso para qualquer fã de rock, de folk ou simplesmente de música. E o melhor é alternar a leitura de algumas páginas com audição de discos antigos de Dylan. Clique aqui para ver um clipe de Dylan no festival, cantando “Like a Rolling Stone”, empunhando a guitarra em público pela primeira vez.
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STREAMING
Próxima estação: um hospital clandestino
A série original é norueguesa, e não foi exatamente um grande sucesso. Mas era original e inventiva, a ponto de motivar a produção de uma versão britânica, que ficou muito melhor. “Estação Temple” teve duas temporadas, entre 2019 e 2021, e passou meio batida antes da chegada da pandemia. Agora, novamente disponível, desta vez na ClaroTV+, pode ser apreciada como uma série de médicos, o que ela é mesmo, tecnicamente falando, mas também como um thriller pesado que propõe uma situação inusitada para o doutor Daniel Newton. Ele enfrenta problemas financeiros para dar o tratamento que sua mulher necessita para tentar sobreviver a uma doença terrível. Ele vai encontrar em túneis abandonados no metrô um espaço para montar uma clínica clandestina, ou “alternativa”, como o personagem gosta de dizer. Em seu jogo de palavras, para atender “pessoas que não se encaixam no sistema”. Ou seja, bandidos que seriam presos ao colocar um pé em qualquer hospital. A fauna de pacientes que busca ajuda nessa medicina subterrânea já garante muito material para bons episódios. Há um clima de “Breaking Bad”, na linha de homens bons fazendo serviço sujo por uma boa causa. Mas o principal motivo que faz “Estação Temple” ser muito agradável de assistir é o ator Mark Strong. Com longa carreira de coadjuvante em filme e séries, que o transformam em um daqueles atores que todo mundo parece já ter visto em algum outro filme, ele constrói o personagem com um perfeito balanço entre um médico frio, que facilmente domina a situação a seu redor, e um homem apaixonado e desesperado que às vezes mete os pés pelas mãos. “Estação Temple” é uma indicação para quem quer ver alguma coisa que foge um pouco dos padrões. No entanto, é preciso reconhecer que a segunda temporada foi muito mais fraca que a primeira, que era toda em cima dos roteiros noruegueses. Mas ainda assim é boa diversão até o final. Confira aqui o trailer.
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MÚSICA
A nova geração do rock americano sulista
“Southern rock”, que pode ser traduzido por “rock sulista”, é o rótulo dado a bandas que se formam na região sul dos Estados Unidos e apresentam uma música um tanto “old school”. Suas características obrigatórias: guitarras com levadas aceleradas de country, um pouco de peso, letras simples normalmente dedicadas a mulheres que adoram abandonar os pobres músicos, uma boa rodagem por pocilgas de beira de estrada e uma vontade irrefreável de encher a cara com uísque de milho. Os ícones maiores desse gênero são Allman Brothers e Lynyrd Skynyrd. Bandas de beberrão, é assim que são chamadas. Depois de um bom tempo sem novos nomes aparecerem para tentar levar essa tradição adiante, uma molecada anda se mexendo lá pelos estados do sul da Confederação. E uma banda, bem nova, já infestou a internet de boa música para quem quer se sentir perto do Golfo do México. Them Dirty Roses foi formada pelo irmãos Ford, James (guitarra e vocal) e Frank (bateria). Eles conheceram o guitarrista Andrew Davis e o baixista Ben Crain, que se revelaram também fãs do ZZ Top, uma fixação do quarteto. Começar a ensaiar e compor foi uma coisa rápida. Mais difícil foi tomar uma decisão radical. Os rapazes compraram um trailer para cair na estrada, e nunca mais pararam. São meses e meses morando e ensaiando num espaço minúsculo, parando apenas para shows aqui e ali e algumas sessões de estúdio para alimentar a boa lista de clipes disponíveis na internet. Para conferir como o som do Them Dirty Roses é sulista até a medula, clique nos títulos dessas boas canções para conferir seus clipes: “Candle in the Dark”, “Guide You Home”, “Good Life” e “Highway My Home”, esta última a indefectível balada arrebatadora que toda banda de southern rock precisa ter no repertório. Os meninos não estão criando nada, eles apenas mostram muita competência para seguir o caminho de seus ídolos. Se é para dar algum destaque individual, que seja para o vocalista James Ford, que tem uma voz poderosa e parece não fazer o mínimo esforço para utilizá-la. Longa vida aos Rosas Sujas!
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O MUNDO JÁ FOI MELHOR # 61
Fotos comprovam: a Terra foi habitada por gente muito bacana
Entre 1974 e 1983, uma série de caubói muito diferente foi um dos grandes sucessos da TV americana. “Little House on the Prairie” foi exibida no Brasil como “Os Pioneiros”. Na trama, Michael Landon interpreta o pai de família que tenta dar a melhor educação possível a suas três filhas, que experimentam uma vida dura numa região em que o domínio masculino oferece pouco espaço às questões femininas. Na primeira temporada, ainda em 1974, Leo Penn dirigiu dois episódios do seriado. A foto acima é de um deles, mostrando três garotos coadjuvantes. O loirinho do meio era simplesmente o filho do diretor: Sean Penn, em sua primeira aparição diante das câmeras. O pai nem se preocupou em dar o crédito ao garoto na ficha técnica do episódio. De qualquer maneira, foi o primeiro contato de Sean com as lentes. Ele só retornaria a um set de filmagem em 1979, para um episódio da série detetivesca “Barnaby Jones”, também sob direção do pai. Dois anos depois, estaria entre os principais atores de “Toque de Recolher”, excepcional drama sobre uma revolta em um colégio militar, ao lado de outro novato, Tom Cruise.
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